BARRETO, Afonso Henrique de Lima. Os Bruzundangas. Porto Alegre: L&PM, 1998.
Lima Barreto (1881-1922) foi um importante escritor e jornalista brasileiro, conhecido por suas críticas sociais e por retratar a vida urbana e as desigualdades do Rio de Janeiro no início do século XX. Nascido em 13 de maio de 1881, no Rio de Janeiro, seu nome completo era Afonso Henriques de Lima Barreto. Filho de pais mestiços, enfrentou dificuldades financeiras durante a vida, mas teve o apoio de seu padrinho, Afonso Celso de Assis Figueiredo, o Visconde de Ouro Preto, que contribuiu para sua formação escolar.
Além de romancista, Lima Barreto foi um prolífico cronista, colaborando com diversos jornais e revistas. Sua vida pessoal foi marcada por lutas contra o alcoolismo e problemas de saúde mental, que o levaram a internações psiquiátricas. Ele faleceu em 1º de novembro de 1922, no Rio de Janeiro, deixando um legado literário que só foi plenamente reconhecido após sua morte.
No contexto histórico em que viveu, o Brasil passava por profundas transformações: a virada do século XIX para o XX foi marcada pela abolição da escravidão, o fim da monarquia e a instauração da República, que trouxe grandes esperanças ao povo brasileiro. No entanto, o novo regime político manteve vícios e práticas nefastas herdadas do período colonial.
Com sua genialidade, Lima Barreto denunciou, por meio da sátira, a sociedade brasileira que emergia na época. Em “Os Bruzundangas”, ele cria um país fictício chamado “República dos Estados Unidos da Bruzundanga”, onde um viajante despretensioso descreve as principais características sociais desse lugar imaginado. Nessa sociedade, a economia estava sempre em crise, os políticos eram incompetentes, e predominavam o clientelismo, o nepotismo e os privilégios, características típicas do Brasil do início do século XX. O autor também critica a academia, sugerindo que, em Bruzundanga, os mais premiados eram justamente aqueles que menos sabiam.
No início do século XX, a sociedade brasileira enfrentava o coronelismo, prática comum em diversas regiões do país, na qual grandes latifundiários exerciam autoridade local, elegendo-se ou elegendo seus apadrinhados. O voto de cabresto é ironizado na obra, quando “os mesários da Bruzundanga lavravam as atas conforme entendiam e davam votações aos candidatos, conforme queriam”.
A economia da época era fortemente influenciada pelo café, que polarizava o país entre as duas potências regionais: São Paulo e Minas Gerais, na chamada “política do café com leite”. Lima Barreto não deixa de tecer analogias a esse respeito: “O café é tido como uma das maiores riquezas do país; entretanto, é uma de suas maiores pobrezas. Sabem por quê? Porque o café é o maior moedor das finanças da Bruzundanga”.
Com seu talento literário, Lima Barreto expõe críticas contundentes à sociedade de sua época, mas seu legado permite refletir sobre as mazelas sociais do Brasil atual. Em diferentes rincões do território nacional, muitas vezes esquecidos pela mídia hegemônica, ainda persistem práticas coronelistas e o mandonismo. Para finalizar, cabe questionar: as palavras do autor ainda refletem a realidade brasileira quando ele afirma: “A República dos Estados Unidos da Bruzundanga tem o governo que merece”?
Fábio Gomes,
Professor de Geografia